Meses atrás o S&P 500 chutou a fabricante de veículos elétricos Tesla para fora de seu índice ASG como parte de uma atualização anual da lista. Enquanto isso, Apple, Microsoft, Amazon e até mesmo a multinacional de petróleo Exxon Mobil permanecem.

Como reportado pela CNBC em maio passado, o índice S&P 500 ESG usa dados ambientais, sociais e de governança para classificar e efetivamente recomendar empresas aos investidores. Seus critérios incluem centenas de pontos de dados, agregados por empresa, relacionados à forma como os negócios afetam o planeta e atendem às partes interessadas além dos acionistas – incluindo clientes, funcionários, fornecedores, parceiros e vizinhos. As alterações no índice entraram em vigor em 2 de maio, e uma das responsáveis pelas mudanças índice, Margareth Dorn, explicou em seu blog o problema com a empresa de Musk.
Ela disse que a “falta de uma estratégia de baixo carbono” e “códigos de conduta empresarial” da Tesla, juntamente com episódios de racismo e as más condições de trabalho relatadas na fábrica da Tesla em Fremont, Califórnia, afetaram a pontuação. “Embora a Tesla possa estar desempenhando seu papel ao tirar os carros movidos a combustível das ruas, ela ficou para trás de seus pares quando examinada por uma lente ASG mais ampla”, escreveu a porta-voz da S&P.
A Tesla notoriamente sempre teve uma avaliação baixa, não apenas no aspecto ambiental. Sua cultura empresarial sempre angariou antipatias. No Twitter, o CEO da Tesla, Elon Musk, disse que a S&P Global Ratings “perdeu sua integridade” e “foi aparelhada com falsos guerreiros da justiça social”.
Algo inesperado
Quer dizer então que a Tesla, empresa que mostrou como fazer carros elétricos que as pessoas realmente desejam — carros que podem ser carregados por energia solar (lembre-se que a Tesla também administra a Solar City), e uma das poucas empresas líderes em mostrar que os Estados Unidos ainda podem fabricar coisas não está apta, enquanto Exxon, um dos maiores poluidores do mundo, aparece como um missionário ambiental?
Não é bem assim
A Tesla certamente deu vida ao mercado de carros elétricos, e não há absolutamente nenhuma dúvida quanto a isso. Mas não basta apenas tê-los introduzido para as massas – a maioria dos carros elétricos não são Teslas.
O problema é que outros fabricantes têm a “vantagem do segundo empreendedor”, e a Tesla simplesmente não tem inovado o suficiente para se manter à frente e reter os benefícios de ser o primeiro. Por exemplo, os concorrentes agora alcançaram um ótimo nível de rendimento do conjunto motor/baterias enquanto a Tesla, no momento, não tem nenhum avanço que lhe permita ficar à frente deles.
Se, portanto, a Tesla não tem condições de de mostrar que é mais verde que a concorrência e liderar o mercado, é razoável, por mais crédito que mereça por impulsionar o mercado no passado, dizer que atualmente ela não possui credenciais particularmente fortes em termos de tecnologia verde.

Você não pode simplesmente fazer algo grande em um ponto fixo no tempo e esperar ser bem avaliado por isso para sempre se os outros pegarem o que você fez e fizerem ainda melhor. Obviamente não é assim que os índices funcionam.
Eu arriscaria dizer que o maior problema é que Musk se esticou demais. Por um tempo ele esteve realmente a conduzir a Tesla em várias questões-chave, como a autonomia das baterias. Agora ele parece estar desinteressado e tem se distraído com coisas como mídia social – com sua vacilante oferta ao Twitter. Aparentemente ele precisa voltar seu foco para empreendimentos como Tesla e SpaceX para que possa começar a levá-los de volta à frente da concorrência novamente e para recuperar o valor da Tesla. Caso contrário, acabará como “apenas mais um fabricante de veículos elétricos”.
A pergunta de um milhão de dólares
Por que, afinal, o mercado deveria se preocupar com coisas relacionadas à justiça social? A propósito, as grandes corporações já demonstraram que nunca são “responsáveis”. A aparência de ser responsável geralmente é a única coisa que importa para elas. Por acaso elas já deram aos grupos de Diversidade, Equidade e Inclusão alguma “Equity”? Deram elas algum assento no conselho de diretores aos países pobres da África?
O engraçado é que as preocupações ambientais e as preocupações com a justiça social geralmente estão em conflito direto. As preocupações de justiça ambiental e social muitas vezes estão em desacordo consigo mesmas. Pense na fazenda solar que invade espaços selvagens, ou na desativação de uma usina de carvão em uma comunidade muito pobre, mas cuja substituição custa empregos e aumenta os preços da energia (o que afeta desproporcionalmente os pobres). Claro que existem algumas proposições ASG que parecem sábias quando vistas ao telescópio, mas a maioria delas simplesmente não é. Como categoria o ASG traz profundas contradições em si.
Isso não quer dizer que os dados solicitados e coligidos pelo índice sejam inúteis ou não importantes. É fundamental conhecer a demografia dos funcionários, estatísticas ambientais, bem como ter um corpo de boas regras corporativas. Mas a ideia de estabelecer algum tipo de pontuação empresarial por altos valores morais em ASG é simplesmente estúpida, e nisso tenho que concordar com Musk.
Pessoalmente eu penso que quem realmente quer colocar seu dinheiro onde está sua moral, deve investir em empresas dentro de categorias que se alinhem com seus valores. Você fará mais bem apoiando uma empresa de gás natural que está a projetar usinas de hidrogênio (e deixando claro que é por isso que você fez esse investimento) do que investindo no Google porque ele comprou alguns créditos de carbono.
Mais um artefato da guerra cultural
Ao contrário dos solenes órgãos do “establishment” do jornalismo corporativo, a mídia independente – oi! – costuma ser muito direta sobre as deficiências do ASG. O podcast Breaking Points recentemente trouxe muitos detalhes sobre as recentes operações do governo americano junto ao Deutsche Bank e Goldman Sachs por suposta “greenwashing” [lavagem verde]. Além dos grandes bancos, os políticos também estão jogando rápido e solto com o novo rótulo. Em maio um comissário da União Européia chegou a chamar o gás natural de “fonte de energia verde”(!).

Sem surpresa, o rótulo ASG agora se tornou outra arma da guerra cultural travada para desacreditar adversários políticos. Usada pela direita como uma crítica ao movimento “woke”, e pela esquerda como forma de denunciar o “greenwashing” em empresas de setores que considera “malandros” (como petróleo e gás), a sigla se tornou precocemente datada.
Mas a verdadeira tragédia é que os padrões ASG continuarão a alimentar o crescente ceticismo em relação às mudanças climáticas e aqueles que divulgam de boa fé seus perigos potenciais. Infelizmente, para os céticos todas as iniciativas contra as mudanças climáticas parecem enganosas, não importa como sejam apresentadas, o que leva a crer que eles provavelmente jamais serão persuadidos.
ASG tem todas as características de uma farsa. Faríamos bem em descartar o rótulo junto com todos os males associados a ele.
*Em tempo: até os fundos ASG estão investindo em ações da empresas de Big Oil: Link
Post Scriptum
A Tesla vem sobrevivendo porque as grandes empresas de automóveis ainda não querem fazer elétricos; eles querem fazer picapes de alta margem de lucro e loucamente poluentes. A Tesla foi beneficiária de um esquema que lhe transferiu enormes somas de dinheiro da Ford & GM em troca da venda de carros elétricos. Basicamente, um subsídio indireto do governo, já que o custo de reduzir a poluição efetivamente foi repassado para os compradores de picapes – essencialmente um imposto para quem precisa de uma picape.
Mas, bem, a Ford tem uma picape elétrica a caminho. A GM não vai ficar muito atrás. Não há mais créditos de carbono para a Tesla. Não há mais almoços grátis.
Eu diria que em 10 anos poderemos ver uma fusão/assimilação da Tesla com/por um dos grandes fabricantes automotivos. Principalmente para acesso destes a patentes e engenheiros.