Tirem os Políticos das Redes!

Combater a mentira deixou de ser algo que se faz por nobreza de caráter, com propósitos ideológicos ou cívicos, e se tornou um ato positivo, concreto, contra a sua utilização como ferramenta para desmantelar o bem político e social.

tirem os políticos das redes
Imagem: pexels.com

A jurisprudência da liberdade de expressão teve origem na cláusula de debate [link em inglês, sorry] da Constituição americana, concebida originalmente como um instrumento para garantir aos representantes do povo imunidade contra achaques baseados na expressão de suas ideias no curso dos trabalhos legislativos. Mas hoje metastatizou para todo o corpo social na forma de lesões e feridas.

A cláusula de debate funcionava bem quando a informação político-institucional era difundida por telégrafo e publicações regionais, como jornais e periódicos. Agora, no século XXI, com cada representante eleito a ter nas mãos uma plataforma de publicação, a capacidade de levar o discurso para fora do contexto clássico tem dois efeitos interessantes: 1) os representantes mudam seu comportamento para (retro)alimentar as plataformas, e 2) as plataformas funcionam 24 horas por dia, 7 dias por semana, 365 dias por ano, induzindo representantes desonestos e de má-fé a aplicar as cláusulas de discurso e debate de forma falsa e abusiva, ao mesmo tempo que as vinculam, como garantia, a todas as suas atividades.

Assim, a atividade política se desvia cada vez mais dos atos constitucionais de mandato, e se torna cada vez mais um auto-serviço à sua própria causa e agenda.

O remédio

Defendo a noção de que os políticos que atuam como funcionários do governo, ou representantes do povo em quaisquer esferas e em qualquer capacidade devem [por força da lei] comunicar principalmente através de canais oficiais, em vez de dependerem de plataformas de redes sociais, e que a sua presença nas redes sociais pode ser considerada um abuso de poder.

1. Os canais oficiais garantem transparência e responsabilização: Quando os políticos comunicam através de canais oficiais, como websites governamentais, comunicados de imprensa ou declarações oficiais, existe um certo nível de responsabilização e transparência. Esses canais muitas vezes passam por escrutínio e seguem protocolos específicos, garantindo que as informações sejam precisas, verificadas e alinhadas com as políticas governamentais. Esta transparência é crucial para manter a confiança entre o governo e o público.

2. Igualdade de acesso para todos os cidadãos: Os canais oficiais proporcionam igualdade de acesso à informação para todos os cidadãos. Nem todos têm acesso ou utilizam plataformas de redes sociais, e depender apenas delas para a comunicação pode excluir segmentos da população, especialmente aqueles provenientes de meios socioeconômicos mais baixos ou de grupos demográficos mais idosos. Ao utilizar canais oficiais, os políticos garantem que as suas mensagens cheguem a um público mais vasto, independentemente da sua presença nas redes sociais.

3. Preservação da integridade institucional: Os governos baseiam-se em instituições e protocolos estabelecidos. A comunicação através dos canais oficiais respeita estas instituições e mantém a sua integridade. Quando os políticos ignoram os canais oficiais em favor dos meios de comunicação social, podem minar os processos e estruturas estabelecidos, levando à confusão ou mesmo à erosão da confiança pública nas instituições governamentais.

4. Mitigar a desinformação e a má comunicação: Os canais oficiais envolvem frequentemente uma equipe de especialistas que garantem que a informação é precisa, consistente e desprovida de desinformação. As plataformas de redes sociais, por outro lado, são suscetíveis à rápida disseminação de rumores, notícias falsas e desinformação. Ao utilizarem principalmente canais oficiais, os políticos podem ajudar a mitigar a propagação de informações falsas e garantir que o público receba informações fiáveis e verificadas.

5. Prevenir agendas e preconceitos pessoais: As plataformas de redes sociais muitas vezes confundem os limites entre as opiniões pessoais e as declarações oficiais. Os políticos podem utilizar as redes sociais para promover agendas ou preconceitos pessoais, o que pode ser prejudicial ao processo democrático. Ao comunicarem através dos canais oficiais, é mais provável que os políticos apresentem informações de uma forma neutra e imparcial, centrando-se nos interesses do público e não nos interesses pessoais ou partidários.

Embora as redes sociais tenham potencial para ser uma ferramenta valiosa para a comunicação, os políticos que atuam como funcionários do governo devem confiar principalmente nos canais oficiais para garantir a transparência, a igualdade de acesso, a integridade institucional, a precisão e a neutralidade. A dependência excessiva das redes sociais pode, de fato, ser vista como um abuso de poder, uma vez que pode contornar protocolos e instituições estabelecidas, conduzindo potencialmente à desinformação e comprometendo os princípios democráticos.

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