Sexta de Leão: as Relações Íntimas Entre Porn & Tech

Ao longo da história das mídias, da linguagem vernacular à tipografia, à fotografia, aos livros de bolso, ao videoteipe, à TV a cabo e streaming, às linhas telefônicas “900”, ao Minitel francês, aos laser-discs e CD-ROMs, até a Internet, a pornografia sempre mostrou o caminho para a tecnologia de consumo. Não é a pornografia, diz um argumento, é a distribuição!

Imagem: iStock

O vídeo ultra-conservador Perversion for Profit de 1965 [sem link para não ferir o ranking do blog] afirma: “A pornografia e o desvio sexual sempre fizeram parte da condição humana, isso é verdade. Mas agora tudo ganhou uma nova dimensão… Impressoras de alta velocidade, transporte rápido, distribuição em massa… tudo se combinou para colocar as obscenidades mais loucas ao alcance de cada homem e mulher”.

Longe vão esses tempos ingênuos diante do inesgotável buffet de imagens e sensações de que o usuário médio de Internet dispõe em 2021. O pornô até o ano 2000 era basicamente Playboy e Penthouse – por mais sexistas que fossem. Hoje a pornografia está mudada completamente, e mudou por causa da internet . A internet tornou a pornografia acessível – e (pseudo) anônima.

Todo mundo conhece a extensão da pornografia, mas poucos percebem seu verdadeiro poder. Ao ler (cursivamente) “The Sex Effect” – que examina as relações ocultas entre sexo e cultura – fiquei surpreendentemente consciente da quantidade de tecnologias de consumo que acabaram sendo adotadas pelas massas por causa da pornografia. Videocassetes, comércio eletrônico, serviços de streaming, marketing de rede – e, em última análise, a própria internet – têm uma dívida de gratidão para com os vendedores de obscenidades que ajudaram a popularizá-los. Porque, embora os militares tenham criado a internet, eles não teriam sido capazes de encontrar uma base de consumidores tão sólida sem a pornografia. Pense nos militares como o inventores/criadores de um serviço e a pornografia como o veículo que leva o serviço às massas.

“De inúmeras formas, grandes ou aparentemente insignificantes, a indústria pornográfica abriu um caminho comercial que outras indústrias estão assimilando e se apressando em seguir”, disse Frederick Lane, autor de “Lucros obscenos: Os empreendedores da pornografia na era cibernética”.

Embora as novas tecnologias de modo geral tenham permitido a expansão da indústria pornográfica, a internet tem sido uma faca de dois gumes para a indústria. A Internet aumentou a prevalência e a popularidade da pornografia, mas também facilitou a pornografia gratuita e de fácil acesso, assim como o conteúdo sexual criado pelo usuário. Muito resiliente, o setor tem sido criativo em superar essas circunstâncias.

Essa indústria nunca parou de inovar, – apesar da falência de muitas empresas pornográficas na última década. Brinquedos sexuais controlados por computador, realidade virtual e avatares sexuais são apenas alguns dos produtos com os quais os executivos do mundo pornô estão fazendo experiências.

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Os modelos de negócio do pornô também evoluíram

Para combater o onipresente conteúdo gratuito, as empresas pornográficas estão criando iniciativas voltadas à experiências premium – tanto ao vivo quanto online. Isso é feito por meio da venda de produtos e serviços derivados, como sessões de fotos (com o vibrador que foi usado durante uma cena de sexo específica); seminários ‘educacionais’ (para ensinar aos casais coisas como dinâmicas da submissão e dominação); tours em estúdios (ao vivo e virtuais); franquias de clubes de strip, swing, bares, lojas, restaurantes, hotéis; webcams ao vivo com as novas divas – as estrelas pornôs; podcasts e rádio; eventos; financiamento coletivo de conteúdo e criação de pacotes personalizados nos quais os consumidores pagam para atuar como diretores e atores… A lista é infindável.

Mesmo que a pornografia tenha tido esse impacto descomunal nas tecnologias de consumo e serviços que as pessoas usam no dia a dia, raramente ela recebe o devido crédito, já que a discussão sobre pornografia na sociedade é sempre – e naturalmente – guiada pela ideologia.

“Se não fosse pelo estigma, a pornografia seria louvada publicamente como uma indústria que soube desenvolver, adotar e difundir novas tecnologias com sucesso e rapidez”, escreveu o historiador Jonathan Coopersmith. “Mas, devido à própria natureza do assunto, o silêncio e o constrangimento sempre foram as reações padrão.”

Embora a maioria das pessoas já tenha usado pornografia casualmente, aquelas que aparecem nas notícias sobre ela normalmente pertencem a dois extremos: lobistas pró-pornografia e fanáticos anti-pornografia tentando convencer os eleitores da justiça de sua causa. Mas até que a sociedade olhe além de seu conteúdo diáfano e de seu complexo significado, o impacto real do erotismo permanecerá em grande parte desconhecido.

Para concluir esta sexta-feira [na verdade, para começar, :wink], deixo um trecho do trabalho de Peter Johnson (1996) “Pornography Drives Technology: Why Not to Censor the Internet” Federal Communications Law Journal: Vol. 49 : Iss. 1 , Article 8], disponível [em inglês] no site do FCLJ

“‘A grande arte é sempre flanqueada por suas irmãs sombrias: a blasfêmia e a pornografia.’ O mesmo é verdade para as artes mundanas que chamamos de mídia. Onde há a Bíblia de Gutenberg, também há Rabelais; onde há correio, também há cartões postais eróticos; onde há um romance de capa dura em três volumes, há a literatura barata em papel reciclado.

A Pornografia, longe de ser um mal que a Primeira Emenda deve tolerar, é um bem positivo que incentiva a experimentação com novas mídias. A Primeira Emenda, portanto, não lida apenas com valor intelectual, moral, político e artístico, mas também com o valor prático e econômico. Insta os adultos, sob consentimento mútuo, desinibidos pela falta de censura, a procurar novos estilos de vida e comunicação, bem como novas maneiras de ganhar dinheiro com os novos costumes. Portanto, embora possa ser politicamente arriscado e socialmente imprudente incentivar a pornografia por computador, os legisladores deveriam se afastar e deixar a midia seguir por onde a pornografia levar.”

* * *

Obs.: Sendo este um blog, o post pretende estimular a discussão agnóstica e desapaixonada. Este texto não representa todas as sutilezas de minha posição pessoal sobre a questão.

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